Na adolescência adorava observar o Céu do alto da serra nas noites sem nuvens, passando os olhos pelos milhares de astros que do local se poderiam abarcar. Via de vez em quando luzes descendo do firmamento e a estatelarem-se algures, longe do ponto de observação. Pareciam estrelas e não pequenos grãos de poeira cósmica ardendo na atmosfera terrestre. Tudo andava em movimento lá por cima. As estrelas e os planetas mudavam lentamente as suas posições ao longo de cada dia e de cada ano. Era um quadro maravilhoso.
Só que aquilo que os meus olhos viam não passava de uma ilusão. Sabia que o Céu actual não correspondia àquele que estava a olhar. Alguns dos astros que agora observava e me pareciam reais por se encontrarem no firmamento visível, haviam desaparecido há milhares de anos e deles já não existiam vestígios no espaço físico onde os meus olhos os viam. Os raios de luz oriundos desses astros desaparecidos, ainda captáveis, vinham de tempos recuados, encurtando-se progressivamente à velocidade de trezentos mil quilómetros por segundo. Traziam as imagens de outrora, que enganavam aqueles que, julgando estar a ver o presente, viam na realidade um passado distante. E muitos outros astros nascidos séculos atrás não eram visíveis na Terra porque a luz que emitem ainda não chegou aqui. Para a ciência, embora existindo, estes astros não existem porque não são detectáveis pelos sentidos humanos nem pelos sofisticados instrumentos tecnológicos de observação e de medição.
Para mim essa era uma das provas de que o mundo exterior que os seres humanos captam poderá não corresponder à autêntica realidade. Nós percepcionamos apenas uma parcela do todo, constituída em parte por coisas ilusórias que parecem ser o que não são.
O mundo observável, real ou aparente, tanto poderá representar uma ordem, acessível à racionalidade humana, ou um caos, de todo ininteligível pela nossa consciência. Por razões de equilíbrio intelectual, sinto necessidade de me auto-convencer de que o universo se enquadra numa ordem comandada por uma lei universal.
A percepção do mundo exterior parece-me ser condicionada por intransponíveis barreiras, estando o homem condenado a permanecer na ignorância da realidade global. Como poderemos estar seguros de que o mundo que a nossa mente percepciona é verdadeiro e objectivo se nem sequer conhecemos a complicada engrenagem psíquica através da qual o captamos? Somos uma espécie de máquinas programadas para viverem as suas existências de acordo com determinados parâmetros estabelecidos pela Natureza, sendo-nos por esta facultados apenas os meios adequados à nossa sobrevivência. E só em circunstâncias excepcionais poderemos levantar o véu que esconde uma maior vertente da realidade global, sendo-nos então acessíveis outros estádios do conhecimento.
A realidade para cada um é aquilo que cada um percepciona e não necessariamente aquilo que ela é em si mesma. Cada criatura vive mais num mundo subjectivo de ilusão do que num mundo objectivo real. Os esquizofrénicos agem de acordo com o que ouvem, vêem e pensam no quadro de um mundo individual muito diferente do mundo dos outros, aqueles que são considerados normais. Ninguém conseguirá convencer um louco de que a verdadeira realidade não é aquela que lhe corre na mente mas outra muito diversa. Como se formarão as irreais percepções auditivas ou visuais que passam na mente dos esquizofrénicos e de outros doentes do foro psíquico é algo que ninguém conseguiu explicar embora haja a suspeita de existirem factores químicos a intervirem no processo.
(texto do autor do blogue)
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