segunda-feira, 6 de maio de 2013

A lanterna


Influenciados pelo meu angélico ar de copinho de leite que na vida se limita a passear o seu «audi», alguns dos meus amigos actuais ficariam surpreendidos se eu lhes falasse da minha passagem pelo inferno do Iraque. Mas nada tenciono contar-lhes. Nunca! Ainda hoje acordo com pesadelos. Vejo-me amarrado a uma cama de um mau hospital, imobilizado com ferros, sujeito a que um estupor, valendo-se da incapacidade que me tolhia, entupisse a minha água engarrafada com comprimidos vermelhos destinados a tratar dores. Horrorizava-me aquela prisão forçada. Que seria de mim se houvesse ali um incêndio? Do canto onde me encontrava via muitas vezes, através da minha miopia, um doente que caminhava lentamente no corredor com uma espécie de lanterna na mão e entrava na casa de banho. Ainda o vejo agora, quando começo a adormecer. Eu sentia inveja de não estar em condições de fazer o mesmo. Ao menos aquele movimentava-se. A «lanterna» seria possivelmente um dispositivo de entrada de líquido numa das veias do paciente. Nunca tentei saber da sua história, nem sequer sei se chegou a sobreviver. 

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