Já tenho feito biscates esquisitos, mas desta vez exagerei. Dias antes passara pelo luxuoso Hotel Travelling e perguntei ao gerente se havia trabalho para mim. Só pelo Natal, para substituição dum porteiro, apareça a seguir ao almoço do dia 24. Olhava-me com ar desconfiado. Você já trabalhou na hotelaria? Fala línguas? Debitei-lhe então uma ínfima parte do meu currículo. Trabalhei em restaurantes de Nova Iorque e Londres a lavar loiça e limpar cozinhas, servi num bar do Louvre em Paris, mas também noutros lugares como Xangai, São Paulo, Bangkok, São Petersburgo…. Pareceu não acreditar, mas condescendeu. Está bem, apareça em 24. E apareci. Na recepção entregaram-me uma farda que não me servia e temi não ter condições para desempenhar a minha função. Mas acabaram por arranjar-me outra, mais próxima das minhas medidas. Na casa de banho olhei-me com curiosidade, não me reconhecia, ali no espelho estava uma espécie de oficial nazi das SS. Com desagrado, acabei por aceitar aquela figura bélica e postei-me três metros defronte da entrada principal, com a pala do boné descida ao nível dos olhos. Sob um holofote, mas hirto como um nabo congelado, ali permaneci durante 16 horas seguidas. Pouco movimento de entradas e saídas, ninguém deu pela minha presença, excepto uma velhinha encasacada, de uns 60 anos de idade, que se abeirou de mim para gratificar-me com uma nota de 20 euros.
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